sexta-feira, 13 de agosto de 2010

Coisas incríveis que aprendi na escola.


Coisas incríveis que aprendi na escola.


No principio aprendi o que era o verbo. E o verbo era ficar. Que em sua nova terminologia significava ganhar beijos e abraços de pessoas do sexo oposto, e algumas coisas a mais dependente do grau de precocidade de cada um. Para os garotos ficar com o maior número possível de garotas era forma de ascensão social, enquanto o mesmo ato para as garotas era uma forma degradação. No pequeno circulo escolar tive minhas primeiras noções de hierarquia e desigualdade étnica.

Seguindo a física aprendi a empregar tempo, velocidade e propulsão apropriada para saltar os muros da escola. Nada pode prender um corpo que não quer permanecer preso. E a liberdade era uma conquista primordial. Mesmo que não se saiba o que fazer dela após recém conquistá-la.

Com a matemática aprendi a fazer o cálculo adequado, que mesmo com o mau comportamento, desatenção e ausências na sala de aula por razões sórdidas, a tirar a nota exata exigida pela instituição escolar para passar de ano sem ficar para recuperação.

Com a psicologia aprendi a estudar o comportamento dos professores e provocá-los até ocasionar um momentâneo ataque de fúria. E depois de ser enviado para supervisores, pedagogos e diretores, convencê-los de que era uma criança inocente sem consciência dos meus atos. Para isso era preciso utilizar atributos das artes cênicas, como manter uma expressão facial semelhante a um cachorrinho sem dono.

Através da história aprendi a seguir certas ideologias. Como diga o que tenho que fazer que farei exatamente o contrário. Pois nenhum homem deve governar outro homem. Sim, eu era um anarquista mirim, que só iria saber o que é anarquismo uma década depois.
Após sair da escola aprendi que vagar por ela como um adolescente revoltado, avesso a regras e indiferente a qualquer forma de aprendizado não foi um bom negócio. Era preciso correr atrás do tempo perdido. E por alguma razão obscura a qual a ciência não explica resolvi seguir o magistério.

Dentro da sala de aula, agora como professor, há dezenas de crianças na minha frente que aparentam serem anjinhos inofensivos. Mas sei que é apenas dissimulação. Vejo no olhar de cada um deles um brilho sanguinário e uma iminente sede de vingança.

Publicado no Paraná Centro em 2009

segunda-feira, 2 de agosto de 2010

Aventuras de um pai iniciante.


Aventuras de um pai iniciante
'


Aprendi com meu filho que trocar fraldas pode ser um exercício perigoso. Além de enfrentar os odores e a sujeira, há também uma torneirinha homicida que dispara jatos certeiros. É preciso sempre estar atento para não ser alvejado.

Descobri que os bebês passam por fases. Meu filho passou por uma fase bovina. O que me obrigava a recorrer constantemente ao Canal do Boi, enquanto ele ficava em frente à TV gritando: Boi, boi, boi! E mugindo. Essa etapa passou, agora está em uma fase caprina. O que dificultou um pouco as coisas, pois não existe nenhum canal de cabrito. O que me obriga a vasculhar na internet imagens e vídeos de cabritos, enquanto ele fica no meu colo gritando: Beeer, beeer, beeer!

A fase do piu-piu, nós superamos quando eu tive a brilhante ideia de levá-lo ao parque para alimentar os gansos. Não percebi quando um grupo sorrateiro de gansos se aproximou pela retaguarda. Tive que erguer meu filho bem alto e partir em disparada, não antes de levar umas bicadas dolorosas nas pernas.

Percebi o que é sedentarismo quando tive de empurrar meu filho por algumas horas em um triciclo de plástico, enquanto ele pedia: Masi, masi... Por mais desatentos que os bebês pareçam, eles prestam muita atenção em nossa linguagem. Tive uma grande supresa quando meu filho cumprimentou outro bebê, levantou o bracinho bem alto e disse: Oi, cala!

Descobri que o fascínio que os homens têm pelo órgão genital vem da mais tenra idade. Cheguei a tal conclusão quando meu filho saiu correndo pelado pela sala, gritando para as visitas: Meu Pipi, meu pipi... Há também nessa idade a curiosidade pelo sexo oposto. Tive de conter o meu filho, quando ele quis entrar debaixo do vestido de uma menina à procura de um pipi. Desde então, ele persegue as garotinhas no parquinho falando: Ham ninina, ham ninina!

Quando meu filho pede comida nem sempre está com fome, às vezes só quer esfregar chocolate nas paredes e espalhar migalhas de bolacha pelo chão. Não importa o quanto eu esteja jururu e cansado, quando meu filho sorri e diz vem PA-PAI, eu vou. E então vamos construir castelos na área úmida; puxar pelo cordão carretinhas e caminhõezinhos pelos corredores da casa; despejar a caixa de brinquedos pelo chão e fazer a maior bagunça. Percebi o quanto é lindo e gratificante ouvir meu filho dizer: Eu amo meu papai. Mesmo que para ele dizer isso, eu tenha de suborná-lo com um punhado de balas.


Publicado No Paraná Centro 09/ 08/ 10
Folha de Londrina 05/08/ 09