quarta-feira, 9 de novembro de 2011

O Amor se foi.


O Amor se foi.

Meu bem o Amor se foi, não se despediu. Não reclamou da toalha molhada sobre a cama, da falta de dinheiro, ou da educação dada às crianças. Não deixou nenhum bilhete na geladeira, acho que não vai voltar. Acho que, sistemático que é, ofendeu-se por não notarmos sua ausência durante dia comum e partiu em silêncio. No entanto deixou aos nossos cuidados seu filho caçula, que se chama Saudade.

Mas meu bem, Saudade chora tanto. Chora quando ouve aquela canção antiga no rádio, quando se deita na cama grande e vazia, quando reconhece algum cheiro na fronha do travesseiro; chora até mesmo, quando recebe carícia de outra pessoa. E esse choro é de um silêncio tão triste que chega a doer na alma.

Saudade é como se fosse um filho nosso agora. Vamos perder noites de sono com o seu choro, ter que lidar com a revolta e insensatez de sua juventude, por fim, seu amadurecimento. Saudade é como se fosse um de nossos filhos, porém ao contrário de nossas outras crianças, nunca nos dará alegria ou orgulho.

O Amor se foi. Fica essa marca de batom no livro que emprestei, outros tantos levou consigo, nunca mais vou ler. Fica o DVD que assistimos juntos, deitados no sofá, o final feliz não será mais o mesmo. Fica uma peça de roupa intima esquecida na gaveta de meias, intocada. Ficam os últimos versos que rabisquei pensando em nós; amassei, viraram bolinhas de papel. Ficam os porta-retratos, cartas, bilhetes, esquecidos em uma caixa de sapatos, empoeirados.

Sei que ainda há Paixão e Atração, mas o Amor se foi, breve eles irão também. É melhor fechar a porta antes que venha o Ódio e a Traição. É melhor trancar as janelas antes retorne a Mágoa e o Rancor. Vamos fechar a casa e tirar férias. Mas eu quero ir para a praia, você para a capital. Quero ir para o norte e você para o sul. Você quer visitar o seu pai, eu a minha mãe. Você quer ir para a cidade grande, eu para o interior. Então é melhor cada um seguir sua própria viagem. Quem sabe não encontramos outro lar. Cuide da Saudade, prometo buscá-la aos fins de semana.

Quem sabe a gente reencontre o Amor. Numa fila qualquer, em uma mesa de lanchonete. Num sábado ensolarado, caminhando no parque. Em uma segunda chuvosa, debaixo de uma marquise, escondendo da chuva. Meu bem, aconteça o que acontecer, não se esqueça de telefonar.



Públicado no jornal Paraná Centro 07/11/11
Folha de Londrina 23/11/11

Nenhum comentário:

Postar um comentário