Atravessando
tempestades.
Apenas quem já enfrentou muita chuva em
cima de uma moto, e amou feito adolescente que não percebe que envelheceu, sabe
do que vou falar.
Quando sai de Cândido de Abreu o céu
estava escuro, o anuncio de uma forte chuva de verão que se aproximava. Todos
me disseram para pernoitar e seguir viagem pela manhã, mas teimei; e munido com
a minha capa de chuva, segui em frente. Tinha a esperança de ser mais rápido
que o tempo. No entanto a chuva caiu
forte e me pegou no meio do caminho. Tanto, que em poucos minutos estava
encharcado, de nada adiantou a capa de chuva. Parei em um ponto de ônibus ao
lado de outro motoqueiro frustrado, entretanto o ponto não protegia nenhum um, nem
outro; até hoje quando passo por lá relembro, batizei aquele lugar de: Curva do
Bobo Molhado. Montei na moto e segui em frente. Poderia ter parado em Manoel
Ribas e posado na casa de um amigo, mas estava determinado em prosseguir
viagem.
Logo a chuva virou tempestade e
relâmpagos riscavam o céu e me senti dentro de um daqueles filmes de
calamidades. Descobri da pior maneira que capacetes não têm limpador de para-brisa,
não enxergava um palmo a minha frente.
Parecia que jogavam baldes d’água em mim. Tive que andar devagar no
acostamento e escorria tanta água na descida do Trevo de Arinha do Ivaí que
parecia que estava atravessando um rio. Parei
no Alto Porã e mandei várias mensagens de texto avisando que estava chegando.
Quando finalmente cheguei, fui direto
para sua casa. Mas você me deixou esperando quase uma hora, molhado até os
ossos, na varanda da sua casa, porque ainda estava no trabalho e havia
esquecido o guarda-chuva. Fiquei tão bravo que fui à porta do seu trabalho só
para dizer que nunca mais queria vê-la. Você pediu desculpas e me convenceu a
ficar. E fiquei a noite toda emburrado com você por ter me deixado esperando, e
você ficou emburrada por eu ter brigado com você, justo no nosso reencontro. E
nem eu, nem você nos demos conta que eu havia atravessado uma tempestade só
para te ver.
Ás vezes não enxergamos que temos que
atravessar uma tempestade para estar ao lado de quem se ama. Mesmo que a
tempestade caia de forma literal. Porque somos cegos tateando o escuro,
tropeçando nas pernas e em tudo mais à frente, como crianças brincando de
cabra-cega. É tão difícil até mesmo para
um poeta ver a poesia do momento, é difícil até mesmo para um escritor capturar
um sentimento e imortalizá-lo através de palavras. É difícil, mas não é impossível.
Impossível é voltar naquele momento e te
encontrar no meio da chuva, abraçá-la com minhas roupas encharcadas, te beijar
com meu rosto e boca molhada e dizer que atravessei uma tempestade e
atravessaria quantas mais fosse preciso só para te ver. E ver seus olhinhos brilhando pelas palavras
doces que nunca te disse.
Tudo passa. Como aquele momento, aquele
sentimento. Como esse vento que refresca nesse mormaço de fim de tarde. Que
precede uma tempestade que já se desenha no horizonte, que levará tudo com seus
ventos fortes e água torrencial, e quando passar o sol vai surgir mais uma vez, para provar que
sempre há um recomeço.
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