segunda-feira, 18 de abril de 2016

Antes de dizer adeus


Na noite em que nos despedimos estava chovendo, talvez a Criação quisesse nos mostrar que as lágrimas que rolavam pelos nossos rostos não eram maiores que a águas que jorravam no temporal, que nossa dor não era mais forte que a tempestade lá fora, que riscava traços de luz no céu escurecido.
Eu hesitava em cada passo, pensando se era certo prosseguir. Diante da porta de sua casa me sentia a um passo do precipício, o vento que anunciava a chuva me dava calafrios. E aquele frio no estômago me acompanha há horas.
Na nossa despedida eu gostaria de segurar sua mão e fitar os seus olhos, decifrar qual era a cor deles no momento, se estavam azuis esverdeados, verdes azulados, depende da luz do sol, da lua, do seu estado de espírito. Mas meu esforço seria em vão, apenas iria constatar, mais uma vez, que não sei decifrar a cor de seus olhos.
Gostaria de trocar boas palavras com você, talvez às últimas, no entanto você sabe que as palavras fogem da minha boca quando mais preciso delas, por isso te deixei uma carta por debaixo da porta. Uma carta de despedida, mais uma prova da minha covardia. Do medo de encarar os seus olhos no derradeiro momento, e ver todas as minhas verdades se desmanchando no ar no instante que me lançasse um olhar triste. E assim, nunca iria te abandonar, mesmo sabendo que seu crescimento depende disso, talvez até mesmo sua felicidade. Já que costumo ferir as pessoas que amo.
E você não vai entender; vai me odiar por abandoná-la. Eu também me sentiria assim no seu lugar. Sempre houve um abismo entre nós, mesmo permanecendo lado a lado, ou um dentro do outro. Nossos corpos sempre se entenderam, dançavam no ritmo perfeito, mesmo eu não sabendo um passo de dança, pois a música tocava dentro de nós. Sei que longe de você meu corpo será castigado pela ausência do seu. Eu buscarei uma substituta barata para descarregar minha frustração, em noites regadas à álcool e música alta, e a decepção será maior ao ver que a garota nos meus braços não é você. E você fará o mesmo; desesperada em busca de diversão, apenas para esfregar na minha cara sua pseudofelicidade.
Vai demorar muito tempo até você voltar a falar comigo, e enfim perceber que foi melhor assim, quem sabe até me agradecer, por libertá-la, por encontrar um novo amor, que a ame sem medo, sem hesitações ou preconceito. Nesse instante irei admirá-la, como uma obra de arte exposta em uma galeria, protegida por um frágil cordão de isolamento, poderia ultrapassá-lo, mas não seria correto. Tenho orgulho de ter ajudado a moldar a obra de arte que você se tornou.
E mais uma vez constatarei que não sei decifrar a cor de seus olhos. Que te amo pela sua ausência. Porque amo o que não possuo, por isso abandono a tudo que amo.

Texto Publicado no site Literatura Amarga, abril de 2016

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